Estamos todos arruinados

Arthur Schopenhauer, na juventude


"Quanto mais elevado é o espírito,
 mais ele sofre"
Arthur Schopenhauer

     Uma vez um homem que admiro muito me disse que o real só poderia ser percebido através de uma dor muito grande. Eu, como dona inveterada de dores muito grandes, venho a anos tentando entender se essa face grotesca da realidade, que me engloba quando afundo em mim mesma, é o que se poderia chamar de realidade em si. Pois, caso a resposta seja assim, estamos todos arruinados.

    Há poucos dias, um professor que estimo muito, reiterou a mesma tese pessimista: a felicidade é feita de ilusões, enquanto na dor, não há nenhuma. Em ambos os casos, levantei minha voz contra o poder inexorável da dor e defendi a felicidade como uma experiência não só real, como poderosa, e crua. Agora, no momento em que escrevo, já não tenho forças pra fazer o mesmo. Então, estamos todos arruinados.

   Todas as mortes ou derrotas dos que amo para o caos, não foram franqueza, e sim um prova viva da impotência perante a grandiosidade da dor. Quando criança, e era sempre verão e não havia consciência constante da solidão, eu achava que poderia salvar os sobreviventes que restavam. Achava que se fosse forte o suficiente, provaria a autenticidade da alegria e tomaria para nós o espaço do êxtase. Agora, não consigo ser forte nem por mim mesma, e então, estamos todos arruinados. 

    Se pudesse, contaria ao quebrados, aos caóticos e ao caídos, sobre as flores que caem das arvores nas estações, sobre a carne tenra do meu gato na madrugada fria, sobre a sensação do risco do grafite sobre o papel, sobre o plenilúnio, a primeira e mais forte lua cheia. Mas assim que esses argumentos saem, tímidos, de minha boca, eles se veem frágeis e se desfazem como cinzas ao vento. E então, estamos todos arruinados.  

    Desesperada, desisto de lutar pelos outros. Desisto de explicar o som aos surdos, a visão aos cegos, e o canto aos mudos. Quando me olhos no espelho, desvanecendo, procuro minha própria alma perdida nos meus olhos, também não me encontro. Em vão, aqueles que me amam clamam meu nome aos ventos. Sozinho, meu gato mia pela casa, me procurando além do que me tornei. Então, vejo que enlouqueci. Sou como surda, cega e muda, aos que antes me era óbvio. Penso que os loucos tem mais razão que os sãos, e o real é, de fato, decepcionante.

    Então, estou arruinada.

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